Felicitações, receios, expetativas e outras considerações

É tempo de felicitar o Dr. António Costa. Iniciou-se ontem um novo ciclo político e a bem do país, esperemos que tudo corra pelo melhor. É verdade que tem tudo para correr mal, dirão os mais reaccionários. É inédito este acordo alargado, ou melhor, “posições conjuntas” do PS com o BE e com o PCP/PEV. Ainda assim, as coligações alargadas não são uma novidade na Europa. Aliás, em países desenvolvidos, as coligações alargadas são até vistas como um sinal de maturidade democrática.

Se assim o é quanto mais para norte avançamos na Europa, nós por cá -iluminados do Mediterrâneo, entusiastas da azeitona britada e da flor de laranjeira – preferimos o clubismo e o extremar de posições ideológicas. Não é defeito, é feitio.

Bem que poderíamos discorrer sobre o tacticismo político de António Costa, sobre a vitória de secretaria, sobre o golpe de estado, com a breca, sobre o efeito que a agulha hipodérmica de Lasswell terá tido no novo líder do Partido Socialista por via dessa obra-prima que é o House of Cards, mas sejamos francos: o novo governo é legítimo, constitucional e esperemos confira a estabilidade necessária para o cumprimento da legislatura e para o desenvolvimento sustentado de Portugal. Não obstante, poderá e deverá sempre ser questionada a eficácia desta solução política sob a égide da governação.

Por mais penoso que tenha sido o caminho percorrido nos últimos quatro anos, é por demais evidente o quão contraprodutivo será reverter uma linha de acção política, sem que esta encontre o tempo necessário para surtir os efeitos esperados na economia real. Ora se assim o é, não menos importante será levar em consideração a natureza inflamável e volátil da condição humana que, ao vislumbrar a possibilidade de um alívio rápido da contracção a que foi sujeita facilmente se deslumbra, negando à memória a sua função enquanto conselheira. Há depois a pertinente questão da estabilidade política, que não está somente relacionada com os deuses do mercado (como muitos nos fazem crer), mas também com a inevitável dança de cadeiras. Muda o diretor geral, muda o governador, muda a repartição, muda tudo e mudam todos, pelo que inevitavelmente muda também a confiança dos investidores e é posta em causa a iniciativa privada, a tal que tem capacidade efetiva para gerar crescimento, e subsequentemente, emprego.

Argumentam muitos que quem votou no PS não votou no BE ou no PCP e quem votou no BE ou no PCP não votou no PS.  O Dr. Costa é um herói por ter conseguido negociar à esquerda, mas peca por começar também com o pé esquerdo. E sobre este aspecto, não há nada a fazer: os portugueses viram e assistiram expectantes e incrédulos ao limbo a que um líder derrotado sujeitou o país. Por outro lado, é explícita a amargura com que a Direita deixa o poder. Apesar de proliferar esta ideia de que é muito fixe dizer-se de Esquerda, os partidos da coligação precisam manter a racionalidade política, sem se deixarem consumir pelas emoções voláteis do eleitorado. De outra forma, todas as acusações que dirigiam à esquerda se voltarão contra si.

A traição, essa a que alguns eleitores foram sujeitos, não é novidade na política da cosa nostra. De facto, talvez seja esta a pedra angular para uma percepção mais alargada da política – os portugueses estão insatisfeitos, desiludidos e amargurados com esta classe política, não com um ou outro governo. Já basta de uma política de oposição. Já chega de esquerda e de direita, é tempo para uma construção partilhada de rumos e sentidos. Bem sabemos, tais são os anticorpos, que oxalá não mude apenas a cadeia de distribuição de tachos.

A bem do supremo interesse nacional, esperemos que os meios a que o país foi submetido realmente justifiquem os fins. O Dr. António Costa tem nas suas mãos uma possibilidade ímpar para provar ser possível uma outra política caracterizada pelo diálogo, pelos consensos alargados e norteada pela vigilância contínua à acção política. O Dr. Costa escolheu de entre todos o mais arriscado e tortuoso dos caminhos, mas é como se diz: quanto maior o risco, maior a recompensa.

Síntese dos Dias ou o que realmente importa saber sobre os últimos meses

Afinal a Grécia não saiu do Euro, que a propósito ainda não atingiu a paridade com o Dólar. O Papa Xico foi assaltado, a Europa tem recebido milhares de refugiados que apesar de fugirem das barbáries do Estado Islâmico, também este tem importado o terror para o velho continente – sexta 13 foi a vez de um atentado coordenado em Paris. A Europa está assim em estado de sítio, numa altura em que a coligação PSD/CDS-PP ganhou as eleições, mas perdeu o governo para uma maioria parlamentar PS/BE/PCP. O essencial da informação, sem a análise dos opinion makers do costume.